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30 anos Depois Do Primeiro Encontro, Portugal E Os Cradle Of Filth Renovaram Os Votos, No Lisboa Ao Vivo

Reportagem de Diana Silva (fotografia) e João Barroso (texto)

Cradle of Filth

Ao final da tarde de domingo, o coração da Avenida Marechal Gomes da Costa, onde Chelas descansa à sombra dos Olivais, pintava-se de negro: a Prime Artists preparara um cardápio musical de peso, no salão de festas do Lisboa ao Vivo, sendo que o destaque caía sobre o regresso dos britânicos Cradle of Filth a território nacional, numa altura em que se celebram três décadas do primeiro e arrebatador encontro.

A noite, porém, reservava-nos outros motivos de interesse, pelo que não era de espantar que a fila fosse longa, minutos antes da abertura de portas.

Black Satellite

O serão começa ao som dos norte-americanos Black Satellite, banda fundada em 2017, na cidade de Nova Iorque. Por esta altura, ainda que cedo, já a moldura humana é considerável, para escutar o Industrial/Alternative Metal da formação liderada pelo guitarrista Kyle Hawken e pela carismática vocalista Larissa Vale.

“Make some fucking noise!”, ordena Larissa, antes que o quarteto ensaie os primeiros acordes daquele que será um concerto curto, mas intenso.

Black Satellite
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Com uma sonoridade que faz lembrar aquilo a que se convencionou chamar de “Nu Metal”, os Black Satellite cativam as gerações mais novas, ao mesmo tempo que criam uma onda de nostalgia, entre todos aqueles que viveram a sua adolescência na viragem do milénio e que, de alguma forma, foram seduzidos por esse “novo metal”.

“What the fuck is up, Lisboa?”, pergunta Larissa. “We are Black Satellite, from New York City! Are you ready for the show?”, continua. Talvez nem todos estivessem… A atuação do conjunto originário de Terras do Tio Sam é pautada pela energia contagiante de Larissa Vale e seus pares, passa pelos dois novos singles, “Broken” e “Void“, e termina com uma muito aclamada cover de Rammstein. “Sonne“. Pelo meio, a banda agradece aos Cradle of Filth, mete a sala a saltar e rende-se ao calor do público lusitano. “Thank you so much!”, escuta-se, no final.

Mental Cruelty

Seguem-se os germânicos Mental Cruelty, o que leva a uma mudança da tonalidade sonora. A ementa servida pela Prime Artists é variada e, agora, a proposta é Deathcore, temperado com doses subtis, mas nítidas, de Black e Symphonic Metal.

“Lisboa, are you ready to party?”, pergunta o vocalista Lukas Nicolai, assim que a formação oriunda de Karlsruhe sobe ao palco. Começamos por ouvir a sequência de abertura de Zwielicht, álbum de 2023, o instrumental “Midtvinter” e “Obsessis a Daemonio“, tema que deixa bem evidentes as influências que os alemães transportam consigo e incorporam na música que compõem.

“How the fuck are you? We are Mental Cruelty, from Germany, and this is “King ov Fire“!”, anuncia Nicolai. Na sequência, “Forgotten Kings“, mais uma do último registo da banda.

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“Are you having a great time, Lisboa?”, questiona o frontman. “Now has come the time to ask a very important question: are you ready for some Black Metal?”. O coro de aprovação é esclarecedor, tal como a descarga de adrenalina que transpira da plateia, assim que ecoam as primeiras notas de “Nordlys“… “Lisboa, give me a circle pit!!”, diz, imperativo, o cantor. “I wanna see everybody going crazy!”. O homem não pára, mostrando-se um verdadeiro entertainer. Durante “Zwielicht“, pede que se acendam as luzes dos telemóveis, criando um efeito pouco visto, em espetáculos deste género.

“Obrigado! Now, get yourselves ready for the last track… It’s time to lose your minds!” E escutamos “Symphony of a Dying Star“, entre incessantes circle pits e gritos da plateia, fazendo jus ao pedido de Lukas Nicolai.

Butcher Babies

Se as performances de Black Satellite e Mental Cruelty haviam servido para aquecer a audiência, o concerto de Butcher Babies fez com que o público fosse obrigado a transpirar até à última gota, embora não tanto como a frontwoman Heidi Shepherd, um autêntico furacão que iria atravessar os quatro cantos do Lisboa ao Vivo. E eram muitos os que aguardavam pela atuação dos californianos…

Fundada em 2010, na cidade de Los Angeles, o conjunto norte-americano navega entre o Metalcore, o Groove e o Thrash Metal, contando, até à data, com dois EP e quatro álbuns editados, o último dos quais em Julho de 2023, o disco duplo Eye for an Eye…/…’Til the World’s Blind. E é deste registo, precisamente, a primeira música que se faz ouvir (“Backstreets of Tennessee“), não sem que, antes, Heidi nos cumprimente com um caloroso “Lisbooon!” e nos convide a saltar. Segue-se “Red Thunder” e uma pausa para respirar, em que a cantora aproveita para saudar o público lisboeta, recordando que, há praticamente um ano, os Butcher Babies pisaram aquele mesmo palco, como uma das bandas de suporte a Fear Factory.

“Allow me to introduce ourselves, in case you’re asking who the fuck are we: we are the Butcher Babies!”, apresenta Heidi, segundos antes de soarem os riffs de “Monsters Ball“. Depois, qual maestrina, incentiva-nos a pular e a cantar, enquanto corre pelo palco, ensaia autênticos golpes de uma qualquer arte marcial e desce à platéia, juntando-se ao headbang dos fãs… “You are beautiful, Lisboa…”, agradece. Continuamos com “King Pin” e “Sincerity“, um tema novo. “This is a new one and you are amongst the first to hear it!”, anuncia.

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“I need to know…I’m dying to know what time it is…”, confessa Heidi Shepherd. “It’s Killing Time, Baby!“. Pedem-se palmas, mãos no ar e mais saltos, e a audiência segue o repto, conduzida pela incansável líder. Entretanto, ouvimos “Beaver Cage” e “Spittin’ Teeth“, até que desaguamos num dos momentos mais emotivos da noite: “This next song is really personal, but I want to share it with you, tonight…”, explica a cantora, contando-nos, de seguida, que escreveu a música na sequência de uma depressão pela qual passou, em dezembro de 2018. “You saved my life, Metal Family! And this was written for you…”. E ficamos com “Last December“. Começa sozinha, a cappella, mas a banda não tarda a juntar os instrumentos à sua voz. “Sing with us, Lisboa!”, desafia, terminando de joelhos, enquanto agradece, comovida.

Antes do final, cantam-se os parabéns ao aniversariante, o baterista Devin Nickles, e fazem-se as despedidas. “We are the Butcher Babies! Thank you so much, Portugal!”. “Magnolia Blvd” fecha o alinhamento.

Cradle of Filth

Depois das entradas, que muito aprouveram à plateia, chega a hora do prato principal. Mas esta não é uma iguaria qualquer: há 35 anos que os Cradle of Filth nos servem um imaginário gótico, envolto numa aura de horror e romance e povoado por vampiros e outros seres obscuros.

Chef de serviço, o incontornável Dani Filth, tem com Portugal uma relação estreita. Quase umbilical. Afinal, um dos primeiros concertos dados no exterior pela banda que fundou, e à qual dedicou toda a sua carreira, aconteceu em Penafiel, na bela e vetusta Lusitânia, corria o ano de 1994, como fez questão de lembrar o músico.

A atmosfera torna-se lúgubre, como se pede, e a entrada em cena do conjunto de Suffolk é feita ao som do instrumental “The Fate of the World on Our Shoulders“, tema de abertura do álbum Existence is Futile, de 2021. Tal como no disco, segue-se “Existential Terror” e ouvem-se os primeiros gritos estridentes de Dani Filth. Aqueles que tornam tão característica a música de Cradle of Filth.

Entretanto, os acordes de “Saffron’s Curse” têm o condão de despertar a plateia, ainda inebriada pela sequência inicial. Observam-se os primeiros crowdsurfers da noite. Depois, o clássico “The Forest Whispers My Name“, retirado do registo de estreia dos britânicos, faz descer uma densa névoa sobre o Lisboa ao Vivo. No palco, o mestre de cerimónias fita, embevecido, a sua horda de criaturas das trevas. Bate no peito e pede palmas. Obedecemos.

“Let me present you a song entitled “She is a Fire”.”, convida-nos Dani, quebrando o feitiço que assombrava os incautos presentes. Fala dos amigos Moonspell, a quem dedica “Malignant Perfection“, música que fará parte do próximo disco dos Cradle of Filth, e pede que façamos barulho, quando introduz “Heartbreak and Seance“, cujo solo nos volta a deixar sob um encanto perverso…

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Chega a hora de tomarmos uma overdose de “Nymphetamine (Fix)“, obra gravada para o álbum Nymphetamine, em 2004, e que contou com a participação de Liv Kristine. Em Lisboa, porém, não houve vislumbre da cantora norueguesa, mas pudemos contar com a voz, doce e maligna, da teclista Zoe Marie Federoff. Como seria de esperar, esta foi uma das músicas mais celebradas e aplaudidas de uma noite que já ia longa. Na sequência, o ambiente torna-se fúnebre e escutamos “Born in a Burial Gown“. A sala é um mar revolto e imperam os circle pits. No palco, Dani Filth cumprimenta os fãs e oferece-nos “Malice Through the Looking Glass“. E é cheios de Mal que nos sentimos, dos pés à cabeça, enquanto as notas de “Creatures that Kissed in Cold Mirrors“, mais um instrumental, nos inundam a alma e, como que por magia (negra), fazem com que a banda se dissolva no ar e desapareça de cena.

“Cradle!, Cradle!, Cradle!”, grita-se. O grupo faz-nos a vontade e regressa para o epílogo.

Recuamos a 1998 e é-nos servida “Cruelty Brought Thee Orchids“. “Are you still out-there?”, pergunta-nos o frontman, pedindo, de seguida, “your portuguese appreciation”, para todos os conjuntos que passaram pelo palco do Lisboa ao Vivo e que têm acompanhado os Cradle of Filth, ao longo desta tour pela Europa.

Ainda há tempo para escutar “Scorched Earth Erotica” e as derradeiras palavras de Daniel Lloyd Davey, o homem que vive por trás da personagem: “This last song goes to each and everyone of you, for coming out tonight!”. Depois, sobre a terra arrasada, cai o nevoeiro e ela surge. “Her Ghost in the Fog“…

30 anos depois do primeiro encontro, Portugal e os Cradle of Filth renovaram os votos. Aqueles que os condenam a viver, em comunhão, até ao fim dos tempos…

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