O Lisboa ao Vivo vestiu-se de negro, numa noite de segunda-feira, para degustar o cardápio musical: Gorod, Skeletal Remains e Obscura, três das melhores propostas da atualidade, dentro do cenário Death, prometiam incendiar a noite lusitana e não deixar “pedra sobre pedra”. O mínimo que podemos dizer é que as nossas expectativas não foram defraudadas!
A abertura de hostilidades é da responsabilidade dos gauleses Gorod, formação originária de Bordéus, cidade famosa pelos seus vinhos, embora esconda outros segredos, como as pautas que regem o som técnico e progressivo da banda que viu nascer nas suas artérias, em 2005.
“Bekhten’s Curse” é a primeira música que se faz ouvir. Ou quase, já que questões técnicas impedem que se escute pouco mais que silêncio. Resolvido o problema, o vocalista Julien Deyres dirige-se ao público, fala da relação com Obscura e pede um aplauso para Skeletal Remains, bandas que subirão ao palco, mais tarde. “We are Gorod, from South France!”, anuncia Deyres, antes de ouvirmos “Breeding Silence”, um dos temas do mais recente registo de Gorod, e “The Axe of God”, canção de 2012. Depois, fala-nos do novo álbum, o The Orb, editado em março de 2023, e junta-se aos seus companheiros, para nos oferecer “We Are the Sun Gods” e “The Orb”, a faixa-título.
“The last one is for you!”, dedica o cantor, antes de se entregar a “Disavow Your God”, música de 2009 que encerra a performance dos franceses. Pelo meio, a resposta do público é muito positiva e os aplausos que se ouvem demonstram que, depois do percalço inicial, Gorod conseguiu convencer a sala 2 do Lisboa ao Vivo, com a intensidade e complexidade dos seus riffs.
Seguem-se os californianos Skeletal Remains, herdeiros de um Death Metal mais clássico, com raízes profundas no estado da Flórida, embora o quarteto que se apresenta em palco seja oriundo do extremo oposto dos Estados Unidos da América.
A sequência inicial traz-nos Fragments of the Ageless, registo editado pelo conjunto de Whittier em março do ano passado e que serve de catalisador para que os primeiros crowdsurfers da noite se façam às ondas sonoras que emanam do palco, o epicentro deste tsunami musical. “Void of Despair” e “Relentless Appetite” são os temas que se fazem ouvir.
“What the fuck is going on?”, cumprimenta-nos o frontman Chris Monroy. “Thank you for being here!”, continua. “We are Skeletal Remains!”.
Recuamos até 2015 e ficamos “Beyond Cremation”, não apenas pelo fogo que exala de cada um dos instrumentos que ocupa o palco, mas também pelo calor humano que acolhe a banda norte-americana. Continuamos com “To Conquer the Devout”, “Devouring Mortality” e “Unmerciful”, por entre corpos que se fundem na plateia, e desaguamos no instrumental “…Evocation (The Rebirth)”, melodia que tem o condão de deixar a sala em transe, esmagada pelo peso das notas que inundam a atmosfera.
“Tombs of Chaos”, extraída do álbum The Entombment of Chaos, de 2020, é a última canção tocada por Skeletal Remains, terminando, assim, uma atuação demolidora que, certamente, já deixa Saudade!
Cabe aos alemães Obscura, “cabeças de cartaz” do evento, a tarefa de encerrar a noite. Originários da bonita cidade de Landshut, na Baviera, os germânicos iniciaram as suas atividades em 2002 e, ao longo de 23 anos de carreira, souberam consolidar-se dentro do cenário Death/Prog mundial, somando, até à data, sete registos de longa-duração, sendo que o mais recente, batizado de A Sonication, saiu no passado dia 7 de fevereiro.
Apesar dos holofotes incidirem sobre o novo registo, o álbum A Valediction, de 2011, seria igualmente alvo de destaque. E é por aí que começamos. Os acordes iniciais de “Forsaken” abraçam a audiência com uma intensidade crescente, dando o mote para o que iríamos viver, ao longo da hora seguinte: abandonamos a vertente “Old School”, digamos assim, e voltamos a um som mais técnico e progressivo, fortemente influenciado pelo Thrash.
“Obrigado!”, agradece o vocalista Steffen Kummerer, antes de embarcar, agora sim, em A Sonication, ao som de “Silver Linings” e “Evenfall”. Depois, um regresso a Diluvium, de 2018, para escutar “Emergent Evolution”, numa altura em que o Lisboa ao Vivo já se encontra imerso no dilúvio musical provocado pela banda.
Kummerer fala de A Sonication, editado na semana anterior, e apresenta-nos “In Solitude”. “Thank you so much!”, agradece o cantor, no final da música. “Are you enjoying the show?”, pergunta. “This is a ballad!”, anuncia, de forma irónica, referindo-se a “Devoured Usurper”, tema durante o qual desafia o público a promover um “circle pit”. Lisboa responde, com entusiasmo, embalada pelo groove que se faz sentir.
Seguem-se “Akróasis” e “The Sun Eater”. A banda sorri, enquanto toca, ao observar o caos que toma conta da sala. Na sequência, somos atingidos por “The Anticosmic Overload”, momento em que a audiência se une aos músicos, formando um só corpo e cantando, como se de um coro se tratasse.
Entretanto, chega “A Valediction”, mas ainda não é tempo para despedidas. Steffen Kummerer relembra a última passagem pela região de Lisboa, em Maio de 2011, data em que subiram ao palco do Revólver Bar, em Almada, “a small place”, e avisa que o próximo tema, “When Stars Collide”, inclui “clean vocals”.
O epílogo surge com “Septuagint” e um convite: “Join us!”. O público acompanha a intro acústica, com palmas, e deixa-se imergir num tema que resume, num só fôlego, a noite que saboreámos.
Antes que soassem as 12 badaladas, o Lisboa ao Vivo saiu da obscuridade e reencontrou a luz. Mas com pena…
