A Meo Arena voltou a encher, para receber a visita de Sir Roderick David Stewart, a propósito da sua digressão mundial, intitulada de One Last Time. Um prenúncio, talvez, de que a reforma está próxima. Enquanto isso não acontece, podemos continuar a apreciar a obra de um artista que soma 80 anos de idade e 60 de carreira, para além de inúmeros êxitos, que o transformaram num dos mais bem-sucedidos nomes da história da música.
A noite seria uma montanha-russa de emoções, à qual não faltaram uma homenagem à sua malograda amiga Christine McVie e a lembrança de que foi às portas de Lisboa que o Celtic de Glasgow, clube que lhe roubou o coração, foi campeão europeu de futebol, no já longínquo ano de 1967.
A poucos minutos da nona badalada, o clássico “The Best”, de Tina Turner, ecoa pela Meo Arena, como que anunciando a chegada do mais desejado. Depois, soam gaitas-de-foles. Uma clara alusão às raízes escocesas de Sir Rod Stewart, que, fazendo jus às suas origens, ordena que o pano suba às 21h00 em ponto. Pontualidade britânica.
Impecavelmente vestido, com um casaco dourado e brilhante, o artista sobe ao palco com a sua banda, cuja indumentária também prima pela elegância. Contudo, o mais importante é a música e os acordes iniciais de “Infatuation” demonstram-no. A reação do público é imediata: todos de pé, para receber aquele por quem tanto esperam. Muitos não voltarão a sentar-se.
Seguimos com “Tonight I’m Yours (Don’t Hurt Me)”. Rod vai dançando, ao ritmo do saxofone, desenvolvendo uma das suas típicas coreografias, enquanto caminha, de uma ponta à outra do palco, e incentiva a audiência que, contagiada pela destreza e agilidade de alguém que já soma oito décadas de vida, também se atreve a bailar.
“Thank you, my friends!”, escutamos.
Entretanto, tira o casaco. Vem aí “Heartache”, clássico lançado pela galesa Bonnie Tyler, em 1977. Esta é uma imagem de marca dos concertos de Rod Stewart. Para além de temas retirados da sua vasta obra, o cantor gosta de incluir canções de artistas que admira. É o caso de “Some Guys Have All The Luck”, música dos The Persuaders, cujo refrão é cantado em uníssono e ao ritmo das palmas da Meo Arena. Como se de um maestro pouco ortodoxo se tratasse, Rod abana a anca, enquanto dirige a coreografia que deve fazer o público, com as mãos no ar.
“Lisbon, what an amazing response!“, exclama Rod Stewart. “This is going to be a wonderful night!“, continua, antes de anunciar o próximo tema: “We are Having a Party, tonight!”. No final da canção, pergunta por uma “young lady” que celebra o seu aniversário. Não lhe oferece um brinde, mas “Forever Young”, música de 1988, parte do álbum Out of Order. Durante o solo, sai de cena e deixa o palco, para que fiquemos a sós com o conjunto de músicos que o acompanha. Há bombos, violinos e gaitas-de-foles. Tonalidades gaélicas. Enquanto apreciamos a fantástica performance da banda, Sir Rod regressa ao púlpito, sob uma enorme ovação. “This is great!“, rejubila. “Thank you for coming out! You will not be disappointed with this evening’s performance!“, promete, perante os risos e sorrisos da Meo Arena.
Regressamos aos convidados. Mesmo que ausentes, muitas são as personalidades que desfilam na noite lisboeta, através da voz do nosso anfitrião. Desta vez, escutamos “The First Cut is the Deepest”, de Cat Stevens. A melodia que emana da harpa tem o condão de deixar a sala sob uma estranha hipnose. Depois, sucessivamente, juntam-se uma guitarra acústica e violinos. E os restantes instrumentos. Por esta altura, também o público é parte do conjunto. Um coro perfeito e afinado.
“Baby, I’ll try to love again, but I know…“, canta-se, a uma só voz.
Quanto os instrumentos se calam, Rod Stewart exalta os artistas “How was it?“, pergunta.

“Proud Mary”, original de Creedence Clearwater Revival é a próxima música que escutamos. Desta vez, sem Rod Stewart. É a banda quem se encarrega de transformar o recinto numa autêntica pista de dança, pedindo palmas a compasso e convocando o coro da Meo Arena. Quando regressa, volta a exaltar os artistas que preenchem o palco, sendo que, agora, apresenta-se vestido com um fato integralmente rosa.
Seguem-se “Maggie May” e “Baby Jane”. Pelo meio, um dos momentos mais emocionantes do serão: a homenagem à artista Christine McVie, que faleceu em 2022. Antes de interpretar “I’d Rather Go Blind”, tema de Etta James, Rod Stewart conta que foi a sua amiga quem lhe mostrou a canção, pela primeira vez.
Numa noite de celebração e de muitas memórias, a veia verde-e-branca do escocês não poderia deixar de se manifestar. Em maio de 1967, o Celtic de Glasgow, clube que lhe roubou o coração, conquistou a Taça dos Clubes Campeões Europeus de futebol, sendo que o cenário foi o Estádio Nacional, às portas de Lisboa. Esse facto é suficiente para que ouçamos uma música que Rod não tem cantado muito, ultimamente. “You’re in my heart, Celtic!“, confessa, apaixonado, antes de nos oferecer “You’re in My Heart (The Final Acclaim)”, tema editado em 1977, com o álbum Foot Loose & Fancy Free.
“Listen to this one, Lisboa! Sing with me!“, pede, imperativo, Rod Stewart. Escutamos e cantamos, a capella, “I Don’t Want to Talk About It”, de Crazy Horse, como nos é ordenado. Acendem-se as luzes dos telemóveis, transformando plateia e bancada numa imensa floresta de pirilampos. Quando termina a canção, Stewart cumprimenta Jimmy, o seu saxofonista. Continuamos numa toada melancólica, ao som de “If You Don’t Know Me by Now”. Porém, no momento em que uma bela e estranha letargia parece querer apoderar-se da audiência, desaguamos em “Hot Stuff”, de Donna Summer, e voltamos a acordar. Mais uma vez, o cicerone abandona o palco, deixando os créditos para os músicos, que interpretam o tema com mestria. Regressa, entretanto, com novo fato e com uma questão existencial: “Da Ya Think I’m Sexy?”. Em busca de respostas, desce à plateia, atravessando-a de um lado ao outro e interagindo com os seus amores, funcionando como catalisador para a loucura que se gera na sala. “Come on, now!“, incentiva, pedindo que cantemos consigo.
“Thank you so much for coming out!“, agradece, antes de nos pedir “Stay With Me!” Ficamos, claro, embalados pelas notas que inundam a atmosfera e impressionados com a forma física do cantor, que não se cansa de puxar pela Meo Arena, enquanto ensaia estranhas coreografias. Depois, sem que tivéssemos tempo para respirar, entram em cena “Hot Legs”. Já ninguém está sentado. Sente-se que o epílogo está perto e aproveita-se cada segundo.
Na reta final, as enormes telas que ocupam o palco enchem-se de água e Rod Stewart coloca um chapéu de marinheiro. É o nosso comandante, enquanto cantamos “Sailing”, em uníssono. De repente, uma bandeira de Portugal surge nos ecrãs, sobre a maré em que navegamos.
“We are sailing…“, escuta-se.
A Meo Arena despede-se do artista, com uma enorme ovação, mas o barulho que ecoa pela sala convoca o “Love Train”, para que possamos fazer uma derradeira viagem. Esta é feita de pé e aos saltos. No palco e na bancada, passando por plateia e camarotes. Quando chegamos à última estação, Rod Stewart deita-se no chão, de braços abertos. Esgotado, quiçá. Afinal, já não é um jovem. Apaixonado, certamente, pelo carinho com foi brindado pelo público que encheu o recinto.
Desta vez, o pano desce literalmente. Mas não queremos que seja o fim. Cá fora, junto ao Tejo, pensamos: “One last time, please!“.